Quando vier a primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que
na primavera passada.
A realidade não precisa de mim.
Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem
importância nenhuma.
Se soubesse que amanhã morria
E a primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois
de amanhã.
S e esse é o seu tempo, quando havia ela
de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que
eu não gostasse. Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.
Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem podem dançar e cantar à roda dela.
Não tenho preferências para quando já não pude
ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.
(Poemas Inconjuntos, heterônimo de Fernando Pessoa)
Já plantei uma árvore, já tive filhas, ainda não escrevi um livro, já cuidei da minha mãe até o fim, preservo uma união de 22 anos, sendo totalmente leal e sincera, cuido de vários animais. A realidade não precisa de mim. Eu não preciso de mim. As coisas são como são. Pode chover, nascer, morrer, viver, adoecer, ficar triste, ficar feliz, tudo está no seu tempo. Tudo.
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo. Tudo é real, mas não há como ter a certeza de tudo.
Mas se eu morrer agora, estarei contente. As coisas foram como teriam que ser. Não há como mudar a finitude de tudo. É assim e é assim.
E as preferências já não existem mais, ou nunca foram preferências nem escolhas. Foram o que estava ali.
O que for, quando for, é que será o que é.
E eu quero ter a consciência e a plenitude de saber quando for. De expor minhas vontades e que as pessoas não tenham preferências, mas que eu tenha escolhas e cabe a mim decidir. Porque cada um sente da sua maneira como ir e vir, quando ir e vir. Por favor, ninguém faça isso por mim.
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